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Um novo olhar sindical no combate ao assédio moral

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Gláudio Castañon e Katianne Kyula

Nas palavras de Renato Ferraz “o assédio moral é um soco na alma” e, é exatamente por atingir a dignidade da pessoa que o assédio causa tantos males psicológicos, os quais geralmente agravam sintomas ou aceleram a progressão de variadas doenças físicas. Em outras palavras, o assédio moral no ambiente de trabalho destrói vidas.

É de se perguntar o porquê em pleno 2024, na era da inteligência artificial, ainda se observa com certa frequência   a existência da nefasta prática do assédio moral no serviço público.

A hipótese mais provável é a certeza da impunidade, seja por falta de órgãos correcionais independentes, evitando-se assim o corporativismo, seja por falta de conhecimento da vítima, receio de retaliações, ou medo de enfrentar o problema de frente tomando todas medidas cabíveis.

Outra hipótese mensurável é o fato de o assédio moral ainda não possuir uma tipificação criminal específica, fazendo com que o infrator tenha uma falsa sensação de permissividade para agir.

No sentido de sanar esta omissão legislativa, o Brasil tem aderido a tratados internacionais, como é o caso do Tratado Internacional sobre a Eliminação da Violência e do Assédio no Mundo do Trabalho (assinado em Genebra, em 21 de junho de 2019, durante a 108ª Conferência Internacional do Trabalho) o qual está em trâmite no Congresso Nacional para ratificação.

No mesmo sentido, já foi aprovado na Câmara dos Deputados, em 2019, o Projeto Lei 4742/01 que tipifica, no Código Penal, o crime de assédio moral no ambiente de trabalho, estando atualmente aguardando apreciação do Senado Federal. A Proposta prevê detenção de um a dois anos e multa para quem ofender reiteradamente a dignidade de empregado, causando-lhe dano ou sofrimento físico ou mental.

Embora, ainda seja praxe nos casos de assédio moral se buscar apenas a responsabilização administrativa do infrator através de (PAD) junto a Corregedoria do Órgão, o que na prática, muitas das vezes não atinge o resultado esperado pois a penalidade não surti o efeito inibidor/educativo, engana-se o assediador que imagina que a única esfera em que poderá responder pelo assédio praticado é a esfera administrativa.

No sentido de apresentar outras  ferramentas de combate ao assédio moral no ambiente de trabalho no serviço público, buscamos embasamento no ordenamento jurídico vigente e jurisprudências e de antemão podemos afirmar que a vítima, amparada pelo seu sindicato, tem embasamento jurídico para buscar a reparação em no mínimo quatro esferas, sendo: Administrativa (Lei Estadual nº 11.882, de 2 de setembro de 2022 e Lei Específica da Categoria); Improbidade Administrativa (art. 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa. STJ – RESP Nº 1.286.466 – RS); Criminal (Lei Federal 14.811, bullying e cyberbullying) e Danos Morais contra o Estado (art. 18 CC; art. 37, § 6º, da Constituição Federal).

No caso específico de Mato Grosso, além do previsto nas leis específicas de cada categoria, a Lei nº 11.882, de 2 de setembro de 2022, dispõe sobre a prevenção e a punição do assédio moral no âmbito dos Poderes do Estado de Mato Grosso.

Discorrer sobre cada item seria demasiadamente longo, mas a lei considera como assédio moral a conduta de agente público que tenha por objetivo ou efeito degradar as condições de trabalho de outro agente público, atentar contra seus direitos ou sua dignidade, submeter a pessoa a difamação, abusos verbais, agressões e tratamento frio e impessoal, comprometendo a sua saúde física ou mental ou seu desenvolvimento profissional.

Dentre as várias tipificações, algumas despertaram a atenção de modo particular, como: atribuir, de modo frequente, ao agente público, função incompatível com sua formação acadêmica ou técnica especializada ou que dependa de treinamento; isolar  ou  incentivar  o  isolamento  de  agente  público, privando-o de informações, treinamentos necessários ao desenvolvimento de suas funções ou do convívio com seus colegas; não comunicar as informações necessárias à execução das tarefas; contrariar sistematicamente suas apreciações e deliberações; criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada; limitar o acesso aos instrumentos de trabalho (telefone, computador, etc); retirar o trabalho que habitualmente executa; atribuir tarefas inferiores às suas competências; pressionar para que não exija seus direitos a férias, horários, premiações e apresentar instruções impossíveis de realizar.

“As pessoas perguntam qual é a diferença entre um líder e um chefe. O líder trabalha a descoberto, o chefe trabalha encapotado. O líder lidera. O chefe guia.”

Embora a Lei traga um rol de atos ou ações tipificadas como assédio moral, esse rol não é taxativo, havendo outros atos ou ações que também caracterizam o assédio, como os descritos na Cartilha de Orientações, Normas e Procedimentos sobre Assédio Moral  do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil (2018), no qual se elenca como assédio moral os atos ou ações de  comunicar com a vítima somente por escrito; proibi-la de falar com os outros; dirigir-se apenas aos outros, ignorando sua presença; silenciar, reiteradamente, diante de solicitação ou indagação para a realização do trabalho ou pedido de informação de qualquer natureza e comunicar-se aos “berros”.

Diante da existência da prática do assédio moral, o servidor público vítima pode (deve) pessoalmente ou através do seu sindicato tomar a primeira medida que é efetuar a denúncia diretamente na corregedoria, para que assim seja instaurado um procedimento administrativo.

Em seguida a vítima pode (deve) registrar um boletim de ocorrência, com fundamento na Lei Federal 14.811 (caso o assédio praticado se amolde ao tipo penal) e manifestar o desejo de representar criminalmente contra o assediador, instaurando-se assim um Termo Circunstanciado de Ocorrência – TCO.

Ato contínuo a vítima pode buscar na esfera cível a reparação a título indenizatório pelos danos morais sofridos com fulcro no art. 186 do Código Civil (Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito).

No entanto, considerando a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 940 com Repercussão Geral, a ação deve ser ajuizada contra o Estado e este por sua vez, tem assegurado o direito de ação de regresso contra o responsável (assediador) nos casos de dolo ou culpa (SÚMULA 341 STF: É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto).

Por último, conforme entendimento firmado pelo STJ no RESP Nº 1.286.466 – RS, no qual se reconhece que a prática de assédio moral enquadra-se na conduta prevista no art. 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, em razão do evidente abuso de poder, desvio de finalidade e malferimento à impessoalidade, ao agir deliberadamente em prejuízo de alguém; a vítima, com o apoio de seu sindicato deve encaminhar ao Ministério Público uma representação, escrita ou reduzida a termo e assinada, a qual conterá a qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento, para que o MP possa instaurar inquérito civil ou procedimento investigativo assemelhado e requisitar a instauração de inquérito policial.

Com a adoção de uma abordagem combativa mais incisiva, esperamos que os diversos problemas causados pelo assédio moral no serviço público sejam mitigados.

Nas palavras de  Helgir Girodo “Criar um ambiente de trabalho produtivo, uma comunicação clara e interativa e um relacionamento interno eficaz e alegre com seus funcionários são necessários três atitudes: cooperação, respeito e gratidão”.

Para finalizar, relembramos o que disse Franklin Roosevelt. “As pessoas perguntam qual é a diferença entre um líder e um chefe. O líder trabalha a descoberto, o chefe trabalha encapotado. O líder lidera. O chefe guia.”

Gláucio A. Castañon é Investigador de Polícia, presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Mato Grosso, licenciado em Letras, bacharel em Direito, pós-graduado em Direito Penal e Inteligência de Segurança Pública.

Katianne Kyula é advogada, pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho.

Matéria por: FolhaMax

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